SPA denuncia lei que ameaça a sua soberania e o seu futuro

A Direcção e o Conselho de Administração da Sociedade Portuguesa de Autores tomaram conhecimento do texto da Lei das Entidades de Gestão Colectiva (decreto-lei nº 100/2017) e não podem deixar de manifestar a sua discordância e repúdio por considerarem que este documento que, em matérias fundamentais, não levou em consideração a opinião da cooperativa dos autores portugueses, com mais de 26 mil associados, pode representar, caso venha a vigorar com a presente redacção, um passo alarmante no sentido da descaracterização e da destruição desta instituição que existe há 92 anos e que desempenha um papel fundamental na vida cultural portuguesa. Nunca em anteriores governos enfrentámos uma situação análoga.

Não pode a SPA encarar passivamente um diploma legal que aponta para a subalternização do papel dos autores na cooperativa que há décadas os representa, para a equiparação de autores a quaisquer outros cidadãos que, não desenvolvendo actividade criativa, desejem ter os mesmos apoios que os autores viabilizam e merecem e ainda para pôr em causa o papel fundamental que o Fundo Cultural, resultante da retribuição de milhares de autores, desempenha em relação à criatividade daqueles que melhor representam a cultura portuguesa.

Lamenta a SPA que o Ministério da Cultura, que ainda não deu concretização a nenhuma das reivindicações apresentadas pela SPA, embora tenha um autor como titular, possa constituir o principal factor de dinamização de um processo cuja génese a evolução desconhecemos e que não perderemos oportunidade de apresentar à comunidade que representamos, convictos de que ela não tardará a reagir, com legítima veemência, a um processo que muito a poderá afectar e que não deixará de merecer o seu mais justificado repúdio.

O nosso país precisa do empenho, da criatividade e da mobilização dos seus autores para fortalecer um prestígio que se impõe em Portugal e no estrangeiro demonstrando que a cultura é um sustentáculo fundamental da nossa identidade.

A SPA fica como sempre disponível para intervir de forma dinâmica num processo que, ao longo de meses, ignorou a sua competência e autoridade, deixando excluídas as suas opiniões e recomendações em matérias que estão presentes na fundamentação e estruturação da Lei das Entidades de Gestão Colectiva.

A SPA já deu conta da presente situação ao Presidente da República e a todos os organismos internacionais cuja direcção integra ou mesmo lidera, como é o caso do Comité Europeu de Sociedades de Autores da CISAC.
A recente alteração legislativa à Lei das Entidades de Gestão Colectiva (decreto-lei nº 100/2017) promovida pelo governo consiste numa inexplicável ingerência do Estado numa entidade privada mas, acima de tudo, consubstancia um ataque gravíssimo ao trabalho e à liberdade dos autores que, a não ser corrigido pelo menos nos aspectos críticos, coloca em causa a existência da SPA como entidade autónoma e centrada na defesa dos criadores.

Acresce que a norma publicada a 23 de Agosto difere substancialmente do projecto que foi apresentado à SPA e de toda a informação que nos foi sendo transmitida, atitude que repudiamos mas que nos escusamos de comentar.

O decreto-lei nº 100/2017 tem diversos aspectos de que discordamos mas são três os que consideramos inaceitáveis e para os quais deverá ser promovida a necessária rectificação.

Artigo 21º n.º 4: a nova redacção permite que qualquer pessoa ou entidade possa representar, até ao máximo de cinco membros, podendo intervir e votar nas assembleias gerais, em seu nome.

De referir que, até esta alteração, e de acordo com os estatutos a representação poderia fazer-se até ao máximo de três, mas, principalmente, a representação era sempre dirigida a um cooperador.

Parece claro o risco de termos um conjunto de pessoas que poderá representar um conjunto ainda mais alargado de membros em matérias muito sensíveis para a vida da cooperativa, sem qualquer noção do que é a gestão colectiva de direito de autor. No absurdo, mas possível pelo diploma, podemos ter qualquer pessoa ou entidade, mesmo sendo completamente arredados do mundo criativo e autoral, mesmo representando interesses contrários aos dos autores, a decidir sobre os destinos da cooperativa dos autores portugueses. Parece-nos clara a manifesta falta de legitimidade.

Artigo 29º nº. 3: prevê-se que qualquer titular de direitos, ainda que não seja membro da entidade de gestão colectiva, possa aceder ao conjunto de acções previstas neste artigo para efeitos de acção social e cultural. O acesso destes titulares de direito deve ser feito de acordo com critérios de equidade, não discriminação e transparência.

Este preceito parece incompreensível, até porque poderemos ter situações que envolvam qualquer pessoa, ainda que não seja representada e mesmo que não tenha obra registada na IGAC ou declarada na SPA, de requerer apoio para fins sociais e/ou culturais. Tal significa que do trabalho dos autores será retirada uma verba para financiar a actividade cultural nacional, tarefa que compete ao Estado e não a uma entidade de gestão colectiva como a SPA.

Artigo 29º n.º 7: nos termos deste preceito, os termos e as condições de utilização das verbas afectas à função social e cultural são aprovados por portaria do membro do governo responsável pela área da cultura.

Este artigo significa que a SPA perde claramente autonomia na definição da política de aplicação dos montantes nas funções sociais e culturais (o que nos parece grave, principalmente, tendo em conta a actividade que a SPA desenvolve nestes domínios). Recorde-se que as verbas do fundo cultural são atribuídas nos termos de um regulamento específico, mediante concurso e publicitadas na página electrónica da SPA.

Artigo 37º n.º 2: balcão de licenciamento conjunto: este artigo foi alterado ligeiramente, referindo-se agora, expressamente, ao licenciamento conjunto electrónico ou presencial. Partindo do princípio que pode não haver acordo entre as entidades, face às tentativas já falhadas, será o ministério da Cultura quem determinará as medidas adequadas à efectiva implementação dos mecanismos de licenciamento.

Tememos que esta situação possa conduzir ao desmembramento da nossa rede de cobranças no terreno.

A SPA não permitirá que esta situação afecte a sua autonomia, o seu rigor e o seu futuro, património de dignidade que este país há muito reconhece.

Lisboa, 15 de Setembro de 2017

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